Resenha: Anna Calvi

Cantora inglesa lança seu primeiro disco; intitulado Anna Calvi, ele explora as duas metades de Anna: a esperança e a escuridão


[por Andréia Martins]

Anna Calvi foi minha aposta no BBC Sounds of…, concurso que a BBC promove todo o mês de janeiro para eleger a grande promessa do ano na música. Apostar em Anna foi um palpite ousado, já que o concurso não tem a tendência de premiar artistas muito experimentais. Mas a conexão com a música dessa inglesa foi imediata e irresistível para essa que vos escreve.

Intitulado Anna Calvi, o primeiro disco dessa cantora meio-inglesa e meio-italiana  foi lançado pela Domino, tradicional selo independente, em 17 de janeiro, e traz 10 faixas que seduzem e intrigam ao mesmo tempo. Não à toa, (quase) todos estão se rendendo a ela. Brian Eno disse que ela é a coisa mais interessante desde Patti Smith – exageros são irresistíveis quando somos tomados pela sensação de que aquilo que esperávamos bate à nossa porta -, e Nick Cave levou a moça para abrir os shows de sua banda. Nada mal para começar a sair do anonimato. Mas, afinal, qual é o grande “it” de Anna?

Talvez a mistura de sensações que as músicas produzem nos ouvintes. Há paixão, angústia, dúvida, desespero, uma necessidade que surge de sair do lugar,de se libertar, mas de que? No caso de Calvi, muitas coisas.

Anna passou boa parte da adolescência lidando com um problema de saúde. Viveu na pele o isolamento, repleta de cuidados e a sensação de estar quase todo o momento em espera. Daí lançar um disco que ronda o gótico, o obscuro, mas que parece ser apresentado no meio de um cabaré, dada a dramaticidade cênica de Anna e seu visual.

Anna é dona de uma expressão forte ao cantar. Seu timbre de voz e o clima de suas músicas lembram artistas como Florence and the Machine, Siouxsie & the Banshees, Arcade Fire, The Cure, além das referências que a própria cita como fundamentais, indo desde Jimmy Hendrix a Edith Piaf.

O debut de Anna foi coproduzido por Rob Ellis, conhecido pelo trabalho com PJ Harvey (além de Marianne Faithful e Placebo), não é difícil reconhecer algumas semelhanças entre o trabalho das cantoras. Mas há uma carga dramática que diferencia o trabalho de Anna e talvez a única semelhança verdadeira entre ambas seja o fato de que nenhuma das duas apareceu para ser negada.

Rider to the Sea abre o disco com riffs dramáticos – se é que algum riff pode ser classificado como tal – e vocais nebulosos, dando o clima do que espera o ouvinte nas próximas nove faixas.

No More Words é a faixa e transição para Desire, música que vai conquistar os fãs saudosos de Siouxsie & the Banshees e Cocteau Twins, cujo clima anos 80 segue em Suzanne and I.

First we Kiss toma ares mais dramáticos, e The Devil dá o toque flamenco ao disco além de explorar, talvez da forma mais intensa entre as faixas do álbum, o vocal de Anna. Blackout é uma das mais pops do disco, seguida da dark  I’ll be your man e da introspectiva Love won’t be leaving – que a julgar pela forma como é interpretada por Anna, fica difícil saber se ela diz as palavras “love won’t be leaving” para se convencer de tal ou se, na verdade, o amor já abandonou o barco faz tempo.

Calvi toca guitarra em todas as músicas – é ela quem manda nos riffs e distorções – e é fácil enxergar o instrumento como uma extensão de seu corpo, acompanhada apenas por Mally Harpaz (teclado e percussão) e Daniel Maiden-Wood (bateria).

O álbum externa as duas metades de Anna, a escuridão, em busca de um surrealismo Lynchiano, e a esperançosa, baseado naquilo que há de mais concreto: a vida real.

Resumindo, o disco de Anna Calvi já é um dos melhores lançamentos do ano, cuja qualidade e honestidade, tanto nas letras quanto nos arranjos, servirão de parâmetro para os futuros lançamentos que vão engordar a lista ao lado dela.

Para ouvir: myspace.com/annacalvi

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